30/11/2017 – “A Constituição Federal foi escrita a lápis e tem sido apagada, inclusive pelo Supremo Tribunal Federal, conforme a decisão que permitiu, em desrespeito ao princípio da presunção da inocência, a execução provisória da pena de prisão após a confirmação da sentença pela segunda instância”. A afirmação foi feita pelo criminalista Nélio Machado, membro efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), nesta quarta-feira (29/11), em São Paulo, na mesa de debates sobre a desconstrução da Constituição, realizada na sessão plenária especial conduzida pelo presidente nacional do IAB, Técio Lins e Silva, na XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira.

Foram discutidos dois temas: A Constituição e sua revogação gradativa em seus 30 anos de vida. As normas infraconstitucionais que alteraram princípios fundamentais do direito de defesa e A quimera da paridade de armas. Também participaram da mesa de debates o orador oficial do IAB e ex-presidente do Conselho Federal da OAB, José Roberto Batochio; a advogada criminalista Letícia Lins e Silva, membro da Comissão de Direito Penal do IAB, e o juiz do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro Rubens Casara, membro honorário do Instituto.

Na sua intervenção, Nélio Machado criticou o instituto da delação premiada. Segundo ele, “a delação premiada é a deserção do direito de defesa, por desprezar o devido processo legal, que inclui, por exemplo, o princípio do juiz natural e imparcial, o que não vem sendo respeitado ultimamente”. O criminalista comentou, também, a atuação de advogados que aceitam a delação premiada nos processos criminais: “Temos, hoje, advogados marcados pelo colaboracionismo e o descompromisso com a legalidade”.

Autoritarismo togado – José Roberto Batochio, que na véspera criticara o STF na sua palestra Delimitação e admissibilidade no direito premial, voltou a apontar falhas no comportamento da Corte Suprema.  “A complacência do Supremo em relação à flexibilização das cláusulas pétreas está deformando a Constituição Federal”, afirmou. De acordo com Batochio, “a Carta Magna, além das vilanias interpretativas, vem sofrendo com as ações de um Ministério Público draconiano e juízes punitivos”.

Batochio disse ainda que a Constituição não é mais referência para os atos dos poderes Legislativo, Executivo e, “o que é mais doloroso”, do Judiciário. O criminalista conclamou os advogados a reagirem às ameaças à democracia e à legalidade: “Temos que resistir ao autoritarismo togado. Essa é a missão do IAB e da advocacia”.

Apresentado por Técio Lins e Silva como “um pensador do nosso tempo”, Rubens Casara iniciou a sua participação afirmando que “o estado democrático de direito se caracteriza pelos limites impostos ao poder”. Segundo o juiz, ”esses limites são os direitos e garantias fundamentais, que estão sendo ignorados”. O magistrado destacou o papel da advocacia para a contenção das restrições às garantias individuais. ”Neste cenário de abandono do paradigma do estado democrático de direito, o advogado se torna um indesejado e as suas prerrogativas são consideradas obstáculos ao punitivismo”, afirmou.

Letícia Lins e Silva propôs que o debate seja levado a outros espaços. “Temos que defender essas ideias em fóruns onde elas não são aceitas, para podermos reforçá-las e propagá-las”, sugeriu a advogada. Segundo ela, “o devido processo legal se transformou em letra morta”.

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Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB)
Assessoria de Imprensa
Fernanda Pedrosa